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8 de outubro de 2019

Afonso Reis Cabral: Vencedor do Prémio Literário José Saramago 2019


Na 11.ª edição do prémio criado pela Fundação Círculo de Leitores para distinguir jovens escritores de língua portuguesa, foi premiado o escritor português Afonso Reis Cabral, pelo seu romance Pão de Açúcar

Afonso Reis Cabral na cerimónia do Prémio Literário José Saramago 2019

 O nome de Afonso Reis Cabral junta-se agora ao de Paulo José Miranda, José Luís Peixoto, Adriana Lisboa, Gonçalo M. Tavares, Valter Hugo Mãe, João Tordo, Andréa del Fuego, Ondjaki, Bruno Vieira Amaral e Julián Fuks, que viram também livros seus premiados com este galardão. O anúncio foi feito por Guilhermina Gomes, presidente do júri do Prémio Literário José Saramago, e Diretora Editorial do Círculo de Leitores, ao meio-dia de 8 de outubro de 2019, na sede da Fundação José Saramago. 

A Fundação Círculo de Leitores e o Grupo BertrandCírculo felicitam o escritor Afonso Reis Cabral por este merecido reconhecimento do seu romance Pão de Açúcar

Abaixo, encontram-se textos de três dos membros do júri sobre o romance premiado:

Texto de Ana Paula Tavares:

Narrado na primeira pessoa, Pão de Açúcar lida com o espesso e confuso mundo da memória e retira do esquecimento acontecimentos que os jornais e os relatórios da polícia tinham tratado de forma redutora e parcial com silêncios e omissões que o autor se propõe aqui revelar.
Afonso Reis Cabral apresenta um trabalho de linguagem (com a linguagem) que alerta o leitor para o que muda e permanece na escrita do romance e na narrativa dos universos recuperados. O autor mergulha na opacidade dos diferentes mundos da cidade velados pelo silêncio e pelo estranhamento e trabalha novos conceitos de vida, da morte e do amor tal como as leis da violência os alargam e tornam perceptíveis. A partir de um acontecimento verdadeiro o escritor desafia-se e desafia o leitor a novos olhares que as regras da escrita e o rigor do texto impõem. Para lá da banalidade do mal e das quietas consciências que com ele convivem, a ciência de contar aproxima do vivido e organiza de forma diferente os acontecimentos que jaziam escondidos nas notícias de jornal e nos relatórios da polícia. A linguagem recupera as vozes e traça a vida verdadeira de todos os implicados.

Texto de António Mega Ferreira:

Partindo de um caso de escândalo transformado em caso de polícia, o assassínio do travesti Gisberta, em 2006, num edifício abandonado do Porto, Afonso Reis Cabral constrói uma narrativa tensa, sob cuja linha narrativa crepita a violência dos excluídos e a raiva dos deserdados. Revelando maturidade narrativa e estilística notáveis, fazendo da contenção a arma da progressão do relato, Reis Cabral adota o ponto de vista dos miúdos administrando a construção de um sentimento grupal de medo e ódio (as fronteiras entre um e outro são ténues) que descarrega no seu elo mais fraco a raiva de uma frustração longamente contida.
A originalidade da narrativa reside precisamente neste ponto de vista, que faz de Pão de Açúcar uma espécie de romance de (de)formação, um texto que relata a formação de um grupo que se reúne num assassinato, na passagem da infância para a adolescência. A ambivalência de sentimentos de todos e cada um em relação a Gisberta mostra que não há trajetos lineares para o crime, nem fatalidades sociológicas num caso que é mais complexo ficcionalmente do que o relato jornalístico habitualmente revela. Neste processo, o narrador não exibe estados de alma nem reivindica anátemas sociais; e é isso, sobretudo, que torna o romance tão descarnadamente efetivo, tão pungentemente cruel. Neste huis-clos que é a cave de um edifício abandonado, onde tudo se joga e tudo se precipita, não há anjos nem demónios, apenas seres deixados à sorte dos seus instintos mais primários. O narrador não condena nem atenua as culpas: todos as têm, no tecido esgarçado deste romance, que é uma das obras ficcionais portuguesas mais arrebatadoras e poderosas dos últimos anos.

Texto de Manuel Frias Martins:

Partindo da estória verídica de Gisberta, um travesti brasileiro assassinado no Porto em 2006 por um grupo de miúdos (doze-quinze anos de idade), este romance inventa um entre a vida e a morte feito de ternura e violência, ingenuidade e malignidade, amizade e preconceito. O registo narrativo exibe um narrador que é simultaneamente autor e personagem (Rafa). O primeiro nunca se desliga da ação, nela se inserindo frequentemente segundo uma espécie de memória dorida da maldade humana. O segundo, um miúdo de doze anos, é a alavanca de que depende o juízo crítico do leitor acerca da miséria, da exclusão e, no fundo, da sociedade que connosco coabita em fantasmagorias demasiado reais. O universo humano e social por que a estória vai evoluindo, apesar de marcado por dores diversas, respira uma compaixão, uma afetividade e mesmo um lirismo a que o leitor nunca fica indiferente.

Romance compassivo mas nunca sentimental, Pão de Açúcar é de uma parcimónia exemplar no que respeita à linguagem e à imagística, sobretudo face à dramaticidade comovente dos envolvimentos humanos da sua estória. Há uma frescura estilística notável que acaba por equilibrar o próprio potencial trágico da obra, gerando no leitor aquele interesse ou aquele querer saber que nos prende irremediavelmente ao texto que vamos lendo. Este é um livro que nos traz o prazer da literatura pelo mistério de tocar a alma mais pungente da realidade, mantendo-se sabiamente, ao mesmo tempo, dentro das ilusões da ficção.
Em suma, este é um grande romance de um jovem autor de quem a literatura portuguesa se pode desde já orgulhar.

Sobre Afonso Reis Cabral:
 
Afonso Reis Cabral nasceu em 1990. Aos quinze anos publicou o livro de poesia  Condensação. É licenciado em Estudos Portugueses e Lusófonos, fez mestrado na mesma área e tem uma pós-graduação em Escrita de Ficção. Foi duas vezes à Alemanha de camião TIR em busca de uma história, a primeira das quais aos treze anos. Trabalhou numa vacaria, num escritório de turismo, num alfarrabista e em editoras. Em 2014, ganhou o Prémio LeYa com o romance O Meu Irmão, que se encontra em tradução em Espanha e em Itália e já foi publicado no Brasil.
Tem contribuído com dezenas de textos para as mais variadas publicações. Em 2017, foi-lhe atribuído o Prémio Europa David Mourão-Ferreira na categoria de Promessa. Trabalha atualmente como editor freelancer.
Nos tempos livres, dedica-se à ornitologia, faz Scuba Diving e pratica boxe.

Sinopse de Pão de Açúcar:
 
Em fevereiro de 2006, os Bombeiros Sapadores do Porto resgataram do poço de um prédio abandonado um corpo com marcas de agressões e nu da cintura para baixo. A vítima, que estava doente e se refugiara naquela cave, fora espancada ao longo de vários dias por um grupo de adolescentes, alguns dos quais tinham apenas doze anos.
Rafa encontrara o local numa das suas habituais investidas às «zonas sujas», e aquela espécie de barraca despertou-lhe imediatamente o interesse. Depois, dividido entre a atração e a repulsa, perguntou-se se deveria guardar o segredo só para si ou partilhá-lo com os amigos. Mas que valor tem um tesouro que não pode ser mostrado?
Romance vertiginoso sobre um caso verídico que abalou o país, fascinante incursão nas vidas de uma vítima e dos seus agressores, Pão de Açúcar é uma combinação magistral de factos e ficção, com personagens reais e imaginárias meticulosamente desenhadas, que vem confirmar o talento e a maturidade literária de Afonso Reis Cabral.

24 de setembro de 2019

Cerimónia de entrega do Prémio Literário José Saramago realiza-se a 8 de outubro


A Fundação Círculo de Leitores tem o prazer de convidar para a cerimónia pública de entrega do Prémio Literário José Saramago, que celebra em 2019 o seu 20º aniversário. O evento terá lugar na Casa dos Bicos, sede da Fundação José Saramago, às 12h00 do dia 8 de outubro (terça-feira).



Dificílimo ato é o de escrever, responsabilidade das maiores.

José Saramago 

18 de setembro de 2019

Prémio Literário José Saramago celebra 20º aniversário



A Fundação Círculo de Leitores, ao criar este prémio, criou – espero eu que assim seja – um instrumento mais para a defesa da língua. É que, quando nós falamos na língua, estamos sempre a pensar na nossa língua lá fora. Quer dizer, a difusão, a promoção, os leitorados, os cursos, tudo isso lá fora. Mas há que levar em conta que a língua começa por defender-se cá dentro.
José Saramago

O Prémio Literário José Saramago, instituído pela Fundação Círculo de Leitores e que distingue bianualmente uma obra literária no domínio da ficção, romance ou novela, completa este ano o seu 20º aniversário.

Este é um prémio que celebra o Nobel de Literatura de 1998, José Saramago, e que se destina a promover a divulgação da cultura e do património literário em língua portuguesa, através do estímulo, à criação e dedicação à escrita por jovens autores da lusofonia.

Em 1999, ano em que foi pela primeira vez atribuído, premiou o escritor Paulo José Miranda. Desde então já distinguiu os seguintes nomes: José Luís Peixoto, Adriana Lisboa, Gonçalo M. Tavares, Valter Hugo Mãe, João Tordo, Andréa del Fuego, Ondjaki, Bruno Vieira Amaral e Julián Fuks.